sexta-feira, 20 de novembro de 2009

A cultura da dívida
(Por Rose Marie Muraro)
Para a maioria dos economistas e o grande publico em geral, esta crise imobiliária a
que chamo “a mãe de todas as crises” começa em 2007 com o estouro da bolha imobiliária
e tem seu auge em setembro e outubro de 2008. Mas não é assim.
Na verdade o seu embrião se implanta em 1971 quando o presidente Nixon cortou o
dólar do padrão ouro e substituiu- o pelo dólar como moeda de referencia mundial. A partir
daí as moedas (qualquer moeda) passam a não ter lastro nenhum a não ser a confiança
daqueles que as usam. Pode-se imprimir, em qualquer país, tanta moeda como se queira. Só
que, nos países cujas moedas não são aceitas para negócios internacionais a impressão
desregrada de moeda dá origem à inflação, que pode se tornar muito aguda, como foi o o
caso da Argentina e Brasil nos anos 90. A única moeda cuja impressão pode não causar
inflação é o dólar, não só por que é moeda de referencia, mas também por que o EUA é a
maior economia do mundo. São eles os maiores importadores mundiais. Assim, quando o
governo americano não fecha as suas contas mensais, os países exportadores
principalmente os do leste e sudeste asiático, correm para comprar bônus do Tesouro
americano, para não perder seu mercado.
É assim que em algumas décadas, o mundo é inundado de dólares. No começo dos
anos 80, quando o PIB mundial era de U$10 trilhões , havia rodando pelo mundo, pouco
mais do que esse montante em dólares.. Hoje em 2008, segundo a consultoria Mckinsey o
PIB mundial passa para U$ 48 trilhões e a quantidade de dólares rodando pelo mundo é de
mais de U$ 167 trilhões.
Isto mudou a natureza do consumo mundial, dando uma sensação de riqueza
ilusória, principalmente no mundo mais rico (EUA, União Européia e Japão). Inicia- se
então, uma “cultura da dívida”. Desde os anos 90 vi amigos americanos usarem até 12
cartões de crédito ao mesmo tempo. Outro amigo que ganhava cerca de U$2 mil mensais
comprou um “carrão” (desses que usam muito combustível) por U$ 40 mil pagando suaves
prestações a perder de vista. Por outro lado, outro amigo meu que pagava tudo à vista, não
teve direito a um empréstimo de U$ 50 mil para completar o montante com o qual pagaria a
casa onde mora hoje, por que não comprava o suficiente a prazo, isto é, por que não tinha
dívida. Assim, a partir dos anos 70 – 80, inicia- se uma era de consumo compulsivo. Desdeo final dos anos 90, a poupança interna americana, passou a ser negativa: - 2%. Aquele
consumo era feito com poupança externa. Isto vai se agravando no final do século XX até o
estouro da “bolha tecnológica”.
Um parêntese: nesses países eram oferecidos empréstimos cada vez mais vultuosos
a pessoas com cada vez menos garantias.Esse capital foi também se espalhando pelos
países emergentes. É certo, que em parte ele contribuiu para o desenvolvimento desses
países, especialmente dos BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China) que cresceram muito. O
consumo de suas classes mais abastadas também cresceu exponencialmente. Instalava- se
no mundo “a cultura da dívida”. Nos EUA as pessoas não tendo mais como pagar suas
dívidas, passaram a hipotecar suas casas no início do século XXI. E as casas começaram a
subir de preço. Uma casa que valia, por exemplo, U$ 200 mil passou a valer U$400 mil.
Seu proprietário podia refinanciar a dívida de U$200 mil para U$ 400 mil. Pagava o que
devia e ainda tinha U$200 mil para consumir mais.
Foi empurrado “goela a baixo” aos habitantes das periferias, a possibilidade de
comprarem a casa de seus sonhos a prestações baixas e juros baixíssimos. Esses juros
foram aumentando e eles já não podiam mais paga-los. Então devolviam suas casas aos
bancos. Essas casas eram cerca de 10 milhões (segundo Nouriel Roubini). Assim começou
a bolha que vemos hoje e que se achava ser a bolha dos “subprimes”, mas é o estouro de
uma bolha muito mais antiga e profunda que é a bolha da “cultura da dívida”, que começou
a estender- se pelo mundo inteiro. Só os consumidores americanos estão devendo cerca de
U$ 14 trilhões, o governo U$ 11 trilhões e os bancos, não se sabe. È o fim do sonho
americano? Provavelmente, e achamos que uma nova era esta se abrindo para a
humanidade, uma era de menos desperdício, menos consumo e mais respeito ao meio
ambiente. O capitalismo não pode viver nem com nem sem o consumo. E aí?

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